Tenho conversado com líderes e gestores de diferentes empresas sobre incentivos, recompensas, engajamento e muitos outros temas que se entrelaçam. Aos poucos, fica cada vez mais evidente: alterar uma prática organizacional já enraizada é, na verdade, mexer com a cultura da empresa — e isso não é simples.

Por isso, lanço uma provocação: seriam os incentivos uma solução eficaz para impulsionar resultados ou estariam, silenciosamente, criando armadilhas que comprometem o engajamento genuíno e sustentável?

Para escrever este artigo, subi em ombros de gigantes e considerei as conversas com líderes e gestores.


Imagine um mundo corporativo onde 70% dos colaboradores estão desengajados, apesar dos bônus, premiações e elogios constantes; esse número é fictício, mas percebo que desengajamento na maioria das vezes não é visível; continuando, e se eu lhe dissesse que as recompensas, tão celebradas como ferramentas de motivação, podem estar sabotando a criatividade, a inovação e o compromisso genuíno? Será que estamos realmente recompensando ou apenas comprando conformidade temporária?

Recompensas funcionam… até certo ponto. Elas promovem resultados imediatos, mas falham em construir engajamento e transformação duradouros. Para liderar pessoas verdadeiramente comprometidas, precisamos ir além das “cenouras” e “estrelas douradas”: é hora de investir na motivação intrínseca.

Alfie Kohn, em seu artigo “Why Incentive Plans Cannot Work”, revela que incentivos externos garantem apenas conformidade temporária — quando a recompensa desaparece, o comportamento desejado também. Apoiado por estudos como o de Teresa Amabile, ele demonstra que a criatividade floresce onde há autonomia e propósito, e não sob pressão por recompensas.

Mas há uma nuance importante: segundo a analista de comportamento Alyce Dickinson, o problema não está na recompensa em si, mas em como ela é estruturada. Quando bem desenhada — baseada em objetivos realistas, feedback contínuo e reforço positivo — a recompensa pode ser um reconhecimento legítimo e um motor de melhoria. Ela alerta, porém, que sistemas competitivos e punitivos transformam recompensas em punições veladas, corroendo a confiança e a colaboração.

Essa tensão revela um paradoxo: ao tentar “comprar” desempenho, corremos o risco de minar aquilo que mais valorizamos — o engajamento voluntário, a inovação, o senso de pertencimento. Como aponta o psicólogo Edward Deci, recompensas percebidas como controle reduzem a motivação intrínseca; mas quando vistas como reconhecimento genuíno, podem fortalecê-la.

Se concordamos que liderar é inspirar e não apenas dirigir, precisamos reavaliar nossos sistemas de incentivo. Estamos cultivando um ambiente onde as pessoas querem contribuir ou apenas “fazendo o mínimo para ganhar a próxima estrela”?

A verdadeira recompensa é construir culturas que promovam significado, autonomia e crescimento — onde o melhor das pessoas não é arrancado por prêmios, mas despertado por propósito.

No fim, a pergunta que todo líder deveria fazer não é “como posso recompensar mais?”, mas “como posso tornar o trabalho tão significativo que ele já seja, por si só, a maior recompensa?” Como trabalhar as motivações intrínsecas dos times, gestores e líderes numa organização e recompensar com base nelas?  É possível?


Seguem os links:

Alyce M. Dickinson – Rewards and Punishment: A Fine Distinction: A Behavior Analyst’s Reply to Alfie Kohn’s (1993) Punished by Rewards –https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/j.1937-8327.1995.tb00677.x

Edward L. Deci & Richard M. Ryan – “Self-Determination Theory and the Facilitation of Intrinsic Motivation, Social Development, and Well-Being” (2000) – https://selfdeterminationtheory.org/SDT/documents/2000_RyanDeci_SDT.pdf

Teresa Amabile – “How to Kill Creativity” (Harvard Business Review, 1998) – https://hbr.org/1998/09/how-to-kill-creativity

Alfie Kohn – “Why Incentive Plans Cannot Work” (Harvard Business Review, 1993) – https://hbr.org/1993/09/why-incentive-plans-cannot-work